Sussurros do alpendre

Publicado em 22 de agosto de 2012 por Zeneide, antes de o bolg haver sido crackeado

 

“Não quero me envergonhar amanhã
daquilo que escrever hoje” André Guide

Começando a conversa

Estou esperando Caroline sair da aula. Sou mãe e espero a minha filha. Há pouco, lá na escola, comemoramos o Dia das Mães.

Vou fazer um livro! As árvores aqui da UFT são inspiradoras. Sentada no cupim abandonado acendeu-se a luz de Einstein. Ops! Pra que mentir a essa altura da vida? A lâmpada é invenção de Edison… e não quero nem saber quem descobriu a América, quero mais é que a cubram novamente.

Pois bem! Vou fazer Meu livro. Ganhei um caderno tudo de bom, sem linhas e de papel reciclado. Capa lindinha com pintura de um menino lendo um livro usando um método maravilhoso: livro aberto ao meio e colocado sobre a cabeça e um sorriso de já sei tudo. Essa ideia ainda vai revolucionar o mundo das leituras.

Zi fez direito, Áurea faz direito, Jackson fez direito e eu faço o quê? Sou fiel cumpridora das leis. Recordo-me daquela que foi inventada para aumentar os livros e as árvores do mundo: Toda a gente deve plantar uma árvore e escrever um livro. Plantei árvores – goiabeira, cajueiro, tamarindeiro, mangueira, áurea caroline… e como meu pés já estão mais pra perto da cidade sem volta… vou cumprir minha outra obrigação.

A bem da verdade vou pedir licença pra contar causos ouvidos na infância. Fui infante! ‘Deus nos concedeu a memória, mas também o esquecimento.’ Quero dar vida a algumas lembranças. Tirar a poeira do esquecimento. Pretendo ficar atenta ao ensinamento de Roland Barths: Sobretudo, não procure ser exaustivo.

Quero escrever algo leve, sem o ranço das coisas mal-resolvidas, de lembranças zangadas e maledicentes. Que essas mal-traçadas-linhas falem duma impressão otimista sobre os homens.

Bom já acertara comigo mesma que iria escrever o livro, faltava o mais difícil. O título da minha obra. Fiquei um pouco apreensiva. As memórias iriam se tornar uma obra? Tomara que não. Lá de onde venho obra não é coisa bonita. Lembro disso com nitidez: tem uma obra no meio do caminho lá da vazante, o menino tá todo obrado, fizeram uma obra no quintal.

O palco das histórias era o alpendre da casa de Madrinha e Padrinho. Principalmente lá. Tantas histórias, falsetas, causos, ranzices, na debulha de feijões ou nas noites de luar. O lugar está habitado de memórias, no frechal das vigas, nos bancos rústicos de madeira, no vão das janelas, penduradas nas telhas, atrás dos armadores… Nas noites silenciosas e sem luar é possível, ainda, ouvir vozes antigas que desejam ser ouvidas e ter suas histórias relembradas. São sussurros do velho alpendre.

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