Lembro-me agora (e recorrentemente) de uma crônica de Drummond.
Na crônica, ele precisava escrever algo para publicar no jornal.
Mas as ideias não apareciam. O texto não fluía. Tentava se concentrar, se desesperava, e nada.
Quanto mais insistia, mais disperso ficava. E na dispersão, acabava reparando no movimento da rua (será que morava em apartamento?).
E uma garota passou a chamar-lhe a atenção: usava tamanquinhos. E passeava tranquilamente na rua, meio que desfilando.
Nada de surgirem as ideias para a crônica. E a garota desfilando com os seus tamancos marcando o passo: tloc tloc tloc.
E o desespero crescendo. E a garota desfilando tloc tloc tloc (será que estava de paquera? parece ser um bom motivo para desfilar um “look” modernoso, com tamancos ruidosos, e provavelmente chamativos, coloridos talvez).
E nada de texto, enredo, leitmotiv, drama, comédia, e essas coisas. e a garota desfilando tloc tloc tloc.
Não sei, mas parece que Drummond via inocência na garota (tomara), mas desfilar assim, por horas a fio, é estranho?
Ou será que o tempo se arrastava por conta da angústia do poeta/cronista?
Será?
Pode ser.
O fato é que a crônica saiu. Diferente. Leve.
Falta de assunto também é assunto, às vezes.