Era uma vez um príncipe que, aclamado pelo povo, retornou ao poder.
O príncipe, comovido, designou como sátrapa um nobre muito próximo ao seu povo — ainda que oriundo de outra satrapia.
O sátrapa, amante das letras e das ciências, solicitou emprestado um guarda-armas de um exército vizinho, e o promoveu a capitão.
O capitão, muito moço, atrapalhou-se em alguns de seus jogos estratégicos, e esse pormenor causou algum mal-estar ao Sátrapa e à sua Dama.
Então, Satrapia erige outro comandante de armas — que se vê tolhido em seus exercícios de comando pela presença incômoda do seu antecessor, que não larga o seu posto.
E agora, a Satrapia não consegue desvencilhar-se do guarda-armas — que, apesar de requisitado de volta pelo seu General, tomou gosto por suas novas honrarias, e faz qualquer negócio para permanecer no comando do exército de faz-de-conta, e pensa que, agora, é General.
Eu pensava que Franz Kafka não havia escrito sobre esse tema: ledo engano.
Não me recordo o título, mas ele escreveu crônica magistral acerca da contratação de exércitos mercenários, para controlar os povos — o povo.
Chega um momento em que os exércitos se tornam um estorvo para os governos — e são deixados à margem, descartados como qualquer objeto, da mesma forma que acontece com as pessoas do povo.
E o povo, que antes era espezinhado pelos exércitos a mando dos príncipes, é quem tinha que lidar com os soldados, agora desprovidos de qualquer humanidade.
Kafka, meu velho, seja bem-vindo ao Tocantins.